ADN Escolas: Escola Secundária de Cacilhas-Tejo
Pela voz da Diretora da Escola Secundária de Cacilhas-Tejo, a Dr.ª Guilhermina Rodrigues, fomos conhecer o ADN de mais uma Escola Secundária. Descobre quais os desafios, a missão e os valores desta Escola, situada na Margem Sul do Tejo.
A Visão, Missão e Valores podem ler-se no site da Escola, na qual é descrita como uma “Escola que prepara para a vida e a cidadania, com exigência e rigor, sem esquecer que se destina a todos e deve ser, por isso, inclusiva”. Que práticas e princípios educativos defende a Escola Secundária de Cacilhas que traduzem esta visão edificadora?
Como Escola Secundária pura que somos, consideramos que devemos preparar os nossos alunos para o mundo que se segue à escolaridade obrigatória. Para isso, acreditamos que responsabilizar os alunos por aquilo que eles fazem, é um bom princípio. Desde o primeiro momento, considerámos a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento como disciplina autónoma, algo que agora é mais comum, mas inicialmente não era, principalmente nestes níveis de ensino. Esta disciplina constitui uma enorme mais-valia, pois permite-nos ter tempo para abordar temas como: a cidadania e a participação democrática – um assunto tão pertinente nos dias de hoje.
Assim, conseguimos incutir-lhes parte da responsabilidade que irão enfrentar, após o Ensino Secundário e não só a nível académico, mas também enquanto homens e mulheres, que no futuro irão mandar no nosso país (assim esperamos).
Por outro lado, os conteúdos científicos não podem ser dissociados destas temáticas, de forma alguma. Temos, sem dúvida, de preparar os nossos alunos para os exames nacionais, por isso, este aspeto continua a ser o nosso foco e nunca pode deixar de sê-lo, pois estas provas representam, por si só, a aquisição de uma série de outras competências. Estas competências são trabalhadas por nós, não só através da disciplina de Cidadania, como também através de outros projetos, nos quais a Escola se envolve e, posteriormente, envolvem-se os alunos – de forma voluntária -, fora do seu horário letivo.
Consideramos estes projetos fundamentais para o desenvolvimento, pois dão-lhes várias competências diferentes e complementares às competências que as próprias disciplinas lhes dão, tais como liderança, capacidade de trabalho em grupo e capacidade de liderar uma equipa. Tudo isto é trabalhado no Ensino Secundário.
Sendo uma Escola de Ensino Secundário, vivem juntamente com os alunos a fase de incerteza que acompanha o fim da escolaridade obrigatória e a possível entrada no Ensino Superior ou no mercado de trabalho. Que tipo de trabalho de Orientação Vocacional fazem junto dos jovens que se encontram nesta fase de mudança?
Nós fazemos dois tipos de orientação: A primeira é feita logo no décimo ano de escolaridade. E porquê? Há um problema que é comum e transversal a todas as Escolas do Ensino Secundário: a escolha que fizeram, diria 20 a 30% dos alunos descobrem, ao fim do primeiro mês, que a sua escolha não foi a mais acertada. Isto é assustador, porque traz enormes problemas de autoestima e, para a Escola conseguir lidar com isso, não é fácil. Por isso, eu recebo os pais dos alunos, antes de começarmos as aulas e falo com eles sobre este problema que é real.
Posteriormente, a nossa Psicóloga vai às turmas todas do décimo ano e a partir do momento em que começam a receber as primeiras avaliações, começa o nosso trabalho. Começamos a procurar incluir os alunos noutras turmas e, por vezes, temos de os encaminhar para outras Escolas, porque não temos uma oferta que se adequa ao perfil do aluno, o que é complicado, pois acabam por “perder” um ano, porque só conseguem estabilizar em pleno, no ano letivo seguinte, mas é sempre preferível a estarem a enganar-se a si próprios. Em fevereiro, reúnem-se aqui na Escola, várias faculdades e as Forças Armadas para dinamizar workshops, especialmente dirigidos aos alunos do 12º ano, mas nos quais os alunos do 11º também podem participar. Esta atividade abrange os alunos dos cursos científico humanísticos, mas também e porque temos uma oferta formativa muito forte, os cursos profissionais. Na Escola valorizamos muito os cursos profissionais, pois estes são uma forma de adquirem uma formação técnica, que os capacita para uma série de tarefas e competências que não acontece nos cursos científico humanísticos. Por exemplo, temos alunos de informática que entram na faculdade, mas têm muita dificuldade em fazer a matemática, mas fazem as cadeiras todas de informática de uma forma exímia. Na área do design acontece exatamente a mesma coisa, e felizmente, já há muitas faculdades e politécnicos, a perceber que estes alunos são muito bons na área que escolhem e então, de alguma forma, dão-lhes a oportunidade de fazer outros testes como alternativa, para acederem ao secundário.
É muito gratificante ver estes alunos que, muitas vezes chegam-nos com uma autoestima muito baixa e ver que terminam aqui o seu percurso, confiantes, bem-sucedidos, a acreditarem em si próprios e a perceberem que são capazes de chegar lá.
Como complemento ao Ensino Secundário, o projeto Erasmus também permite aos alunos desenvolver inúmeras competências interpessoais. De que modo este projeto contribui para que os alunos se tornem cidadãos mais conscientes e globalizados?
Há três anos que temos vindo a apostar muito em projetos Erasmus, porque estes levam os alunos a conhecer e a ver realidades de outros jovens das suas idades, em outras Escolas.
No ano passado conseguimos ter acreditação Erasmus nos domínios do ensino escolar na nossa Escola, portanto mais dirigida aos científico-humanísticos. No final do ano letivo transato, candidatámo-nos a ser Escola Erasmus para os cursos profissionais, ou seja, Erasmus Vet, e recebemos há pouco a notícia de que conseguimos.
Isto é importantíssimo para os nossos alunos, pois irá permitir-lhes fazer estágios no estrangeiro. Esta experiência, para além de ser uma oportunidade que sem este programa dificilmente teriam possibilidade de o fazer, dá-lhes currículo e bagagem pessoais e profissionais. Na Escola acreditamos que as competências devem ser trabalhadas paralelamente às disciplinas, porque os conteúdos científicos e as competências adquiridas são importantes, mas o mundo exige muito mais do que isso, muito mais.
Em termos de competências pessoais, esta experiência dá-lhes a oportunidade de serem capazes de sair sem os seus familiares – com todas as responsabilidades que advêm dessa experiência – nomeadamente, em termos de gestão financeira. O projeto Erasmus é cofinanciado e, portanto, não têm despesas de alimentação e dormida, mas os pais dão-lhes dinheiro para, durante aqueles 67 dias, eles gerirem. Para além desta competência, desenvolvem a importante capacidade de comunicar numa língua que não é a sua língua nativa. Neste caso, a linha de comunicação é o inglês, o que, para as suas vidas académicas e profissionais, é muito importante ser desenvolvido. Para além disso, desenvolvem a capacidade de interagir com os seus pares, aprimoram a responsabilidade exigida pelos trabalhos de equipa, o espírito de liderança, a partilha e interação com outras culturas…
Tudo isto é fundamental para eles se desenvolverem, enquanto pessoas, cidadãos, académicos e profissionais.
Através do site, percebemos que são uma Escola com projetos distintos, como o “Emoções em Foco”, a “Semana do Conhecimento”, o “Clube Ciência Viva” e o programa de Empreendedorismo. Em que medida o envolvimento dos jovens nestes projetos é um complemento à sua formação, enquanto futuros cidadãos ativos na sociedade?
Para além de todas as competências já mencionadas, eles têm a oportunidade de saber em que consiste, realmente, um projeto. Como é que se desenvolve? “Projeto” é uma palavra tão corriqueira, mas implica uma série de etapas, digamos assim, até termos realmente um projeto, e eles não têm esta noção.
Estes projetos em que eles se envolvem, a experiência que eles adquirem, as competências que desenvolvem, fazem com que consigamos, de alguma forma, preparar estes alunos para o que se segue ao Ensino Secundário.
À vossa Escola, foram atribuídos os Selos Escola Saudável e Escola Sem Bullying e Sem Violência. A busca por certificações é uma preocupação da vossa Instituição ou acaba por ser uma consequência de todo o trabalho que se realiza?
São as duas situações, em termos de visibilidade para o exterior, os selos são importantes não para nós, no interior, porque sabemos o que aqui fazemos e o seu valor, mas para o exterior é importante e achamos que tudo aquilo que nós fazemos contribui para a que consiga atingir estas metas. Se me perguntar se há bullying na Escola Secundária Cacilhas Tejo? Há, infelizmente, é impensável não haver, mas a Escola atua o mais precoce e preventivamente possível, de maneira que se consiga atenuar e minimizar esse efeito na Escola. Temos problemas e atuamos para os combater e para procurar soluções.
Portanto, sempre que surge a existência destas candidaturas, internamente consideramos aquilo que nós fazemos e o que nos poderá fazer conquistá-lo. Por vezes, candidatamo-nos e conseguimos, outras vezes não conseguimos, porque ainda falta qualquer coisa, mas deste modo, ficamos com a certeza do que é que falta para conseguirmos ir mais além.
O mundo em que vivemos está cada vez mais digitalizado, o que traz naturalmente novas exigências, especialmente para a área da Educação. Como é que a Escola vive esta fase de uma transição de formatos tradicionais para um universo maioritariamente digital?
Não é fácil, principalmente porque a própria Escola não tem os recursos de que necessita, por exemplo, no que diz respeito à viabilidade da internet que não nos dá segurança para nos suportarmos apenas por formatos online, seja para reuniões, reprodução de vídeos, etc.
A própria Escola não dispõe de computadores para todos e a maior parte dos computadores dados pelo Ministério já não funcionam. Os hotspots de acesso à Internet são de uma operadora e também já não têm acesso. A Escola tem wireless, mas estão em simultâneo, 1035 alunos das 8 da manhã à 13h30 na Escola. Se eles todos dependerem do wireless, não conseguimos trabalhar. Por isso a questão é: “Como é que lidamos com esta temática?” Com a inovação que tudo isto representa, de braços abertos, inclusive com a temática da Inteligência Artificial. Já fizemos sessões na Escola para professores, porque é nesta faixa etária que acredito que devemos começar por desmistificar. Abordámos o que é o ChatGPT e de que forma pode ser uma mais-valia. Quando chegamos à operacionalização destas aprendizagens, não conseguimos operacionalizar da forma desejável, o que acaba por ser um entrave. Em vez de ser uma ajuda, é exatamente o contrário, especialmente quando se preparam aulas, que implicam um trabalho de campo com os alunos, portanto, eles vão virtualmente pesquisar, para conseguirem realizar as tarefas e depois não há Internet.
Portanto, as novas tecnologias são fantásticas se forem pensadas como fonte de conhecimento, eu consigo ir lá buscar uma série de informações que de outra forma, seria quase impensável fazê-lo, quando não se tem os meios necessários é complicado. Para além de que há muitos alunos que ainda não perceberam a vantagem que lhes pode trazer terem nas suas mãos um motor de busca. Há muita falta de literacia digital, saber trabalhar com jogos e redes sociais não é suficiente para o mundo de oportunidades que o meio digital representa. Há competências básicas como formatar um texto, escrever um e-mail, pesquisar no Google, que eles não dominam. O que acontece com o modelo de Educação atual é que estamos a dar-lhes conteúdos, mas não lhes damos competências. É preciso ensinar-lhes a chegar às respostas e não dar-lhes as respostas e este é um percurso que lhes temos de ensinar a percorrer.
A discussão sobre Saúde Mental tem vindo a ter cada vez mais palco na esfera pública. De que modo a Secundária de Cacilhas lida com os temas da Saúde Mental e bem-estar da sua comunidade?
A nossa Escola dispõe de uma Psicóloga a tempo inteiro. E não chega. No período pós pandemia e aproveitando uma das medidas do Ministério da Educação, que era o plano nacional de promoção para o sucesso escolar, a Escola candidatou-se ao projeto para ter mais uma psicóloga e conseguimos. Como está a contrato, não sabemos o que vai surgir no próximo ano cá, portanto, até lá, desenvolvemos um projeto de tutorias que vai um bocadinho além daquilo que é preconizado pelo Ministério da Educação e que apoia os alunos não só com um professor, como com uma psicóloga que vai orientar os alunos e dar-lhes competências para que eles consigam ter sucesso. Eles estão neste projeto até necessitarem, não quer dizer que o aluno entre no décimo ano e que vá até ao 12º ano, muitas vezes eles até conseguem fazer o clique e perceber e, portanto, passa em vez de ser o pulo. Um apoio semanal passa a ser quinzenal, porque ele próprio já não necessita e entretanto, há outros que precisam e vão entrando no projeto. Nós temos cerca de 100 alunos, é muito. Vão dando. Temos 7 professores com 24 horas. É e temos uma psicóloga, portanto, para 100 alunos, mas efetivamente eu gostaria muito de poder dizer que é um projeto para continuar, mas sem psicólogo a gente não pode continuar, portanto, assim, um bocadinho, sem saber como perspetivar o futuro.
Que ambições é que tem para a sua Escola e o que é que gostaria de realizar e concretizar a curto prazo?
Em termos de ambições, pretendemos continuar com a Escola viva, como ela está, com o reconhecimento que eu penso que ela tem aqui, no Concelho de Almada, e principalmente que os meus alunos, os meus professores e o meu pessoal não docente se sintam felizes e parte integrante. Sem dúvida que este é um sonho concretizado, mas que perdure no futuro.
A nível material, eu adorava conseguir pintar a Escola toda no exterior. Temos conseguido manter a Escola fisicamente em excelente estado, mas à pintura exterior da Escola, não conseguimos financeiramente lá chegar.
Acima de tudo, gostaria que continuassemos a ser uma Escola amigável e simpática, na qual todos/as se sentem bem. Para mim, este é um sonho do futuro.