Entrevista | Linda Morango, da Ajuda em Ação, acredita que a ação presente pode determinar o futuro
Para assinalar o Dia Universal da Criança, Linda Morango, Diretora de Marketing e de Angariação de Fundos da ONG Ajuda em Ação, em entrevista, reflete sobre os obstáculos impostos num caminho em constante edificação, que possui apenas (e somente!) um destino: Infância plena e igualitária.
Que valores sustentam a ONG Ajuda em Ação?
A Ajuda em Ação é uma Fundação internacional, de origem espanhola, fundada em 1981, com mais de 40 anos de história. Estamos em Portugal desde 2019, tendo um compromisso com os Direitos Humanos e a Dignidade, através de uma rede de contactos e parcerias comprometidas com a nossa visão do mundo. A transparência e a independência são outros dois valores muito importantes. Orgulhamo-nos de prestar contas às pessoas e Instituições com/para as quais trabalhamos como ONG apartidária, que leva a cabo a sua missão, respeitando a liberdade e a igualdade de todos.
O combate à pobreza, desigualdade, vulnerabilidade e exclusão social é a principal frente de intervenção. Quais são as linhas predominantes que conduzem o desenvolvimento da atividade que executam em Portugal?
Trabalhamos para desenvolver todo o potencial das comunidades mais vulneráveis, como a de Camarate (Loures), através de programas de Educação, Empregabilidade Jovem e Empreendedorismo Feminino, respetivamente, permitindo a entrada direta, de jovens com menos oportunidades, no mercado de trabalho. Apostamos em programas a longo prazo para que a mudança seja sustentada e efetiva. Acreditamos que a formação e o desenvolvimento de competências, ferramentas essenciais da nossa ação, são a chave para que as pessoas consigam sair da sua situação de pobreza e ser protagonistas do seu futuro.
Apoiando centenas de crianças e jovens em idade escolar a desenvolverem ferramentas para uma melhor integração na Escola ou no mercado de trabalho, através de “A Minha Escola é Cool” e “‘Bora Jovens”, que resultados têm sido registados?
Tanto “A Minha Escola é Cool” como o ‘Bora Jovens da Coca-Cola em Portugal, programas implementados pela Ajuda em Ação, têm tido resultados bastante positivos e assinaláveis. O primeiro prende-se com a área da Educação e tem permitido, em conjunto com o Agrupamento de Escolas de Camarate, reduzir o absentismo escolar e melhorar a performance escolar, sobretudo através da aposta na oficina de escrita criativa e a de robótica. Por outro lado, e ao nível da Empregabilidade Jovem, com o ‘Bora Jovens já foi possível formar 363 jovens e integrar no mercado de trabalho mais de 152 jovens. Estamos ainda a desenvolver o projeto Acrescent’Arte em escolas do Agrupamento de Portalegre, para promover uma educação de qualidade e inclusiva através da arte, e também aqui o feedback tem sido bastante positivo. Estas crianças e jovens que integram estes nossos programas são o futuro e acreditamos que apostar neles é caminho para uma sociedade mais justa e igualitária.
“A Humanidade deve à criança o melhor que tem para dar”. Que importância desempenha a Declaração dos Direitos da Criança no bem-estar, felicidade e segurança na infância?
A Declaração dos Direitos da Criança é da máxima importância para que todas as pessoas, entidades e outras organizações saibam, respeitem e cumpram os direitos nela contidos. Todos os direitos enunciados são garantes da felicidade, bem-estar e segurança das crianças. As crianças são o futuro e garantir-lhes universalmente direitos tão básicos e essenciais, como o direito à educação – que deve ser inclusiva, equitativa e de qualidade – e à alimentação, é urgente para que cresçam adultos participativos e envolvidos na sociedade em que estão inseridos e conscientes dos seus deveres, mas sobretudo direitos.
Muitos jovens já mudaram o mundo com os seus discursos, chamando a atenção para os seus direitos, contudo, quase nunca são ouvidos. Que poder considera que a voz dos mais novos pode possuir na promoção à mudança?
Os nossos programas e apoios são dirigidos a muitas crianças e jovens porque defendemos que eles são parte da mudança, são as gerações futuras que têm também a sua quota-parte de responsabilidade. Quando estes grupos estão conscientes do conceito de uma sociedade mais justa e igualitária, onde questões como as alterações climáticas e o respeito pelos direitos humanos não podem ficar de todo esquecidas, têm o poder de somar a sua voz a muitas causas importantes. Além disso, sendo pessoas altamente digitais, com canais próprios, podem fazer circular a sua voz da mudança a uma velocidade grande e com um alcance potente.
E as Escolas?
As Escolas e os docentes acompanham grande parte do crescimento e desenvolvimento das crianças e jovens, logo têm um papel fundamental na formação dos mesmos. Além da formação em sala de aula, devem procurar inspirar e acrescentar ao abraçar programas como o nosso “A Minha Escola é Cool” para que se desenvolvam outras competências tão importantes, e que serão muito valorizadas no futuro, como as soft skills.
Que desafios identifica no futuro?
Os nossos projetos apresentam excelentes resultados e com impacto inegável na vida das pessoas que apoiamos. Contudo, existem alguns desafios que podem colocar em risco o impacto do nosso trabalho e dificultar que a nossa ajuda possa chegar a mais pessoas. O primeiro, diria, é a sustentabilidade dos nossos projetos em Portugal.
Em julho, a ONU publicou um relatório, apelando ao mundo para redobrar os seus esforços para alcançar os ODS até 2030. No entanto, os impactos da crise climática, a guerra na Ucrânia, os recentes acontecimentos na região da Faixa de Gaza e Israel, uma economia global frágil e os efeitos persistentes da pandemia da COVID-19 estão a limitar avanços nesse sentido.
Embora a falta de progresso seja global e, do ponto de vista de uma organização internacional, como a Ajuda em Ação, que trabalha diariamente com populações vulneráveis, com menos oportunidades e recursos, são efetivamente estes públicos, os que mais sofrem os piores efeitos destes desafios. É crucial envolver todos os stakeholders, desde as empresas, a sociedade civil, os cidadãos, o governo, os municípios, as organizações da economia social numa “forte vontade coletiva” de mudar o caminho atual e reacender o progresso visando alcançar todos os 17 ODS em 7 anos.
O nosso contributo nesta Agenda 2030, acontecerá de forma mais eficaz, se tivermos parceiros e doadores envolvidos na nossa missão garantindo que o apoio chega a estas populações, contrariando o ciclo da pobreza, contribuindo desta forma, para a concretização dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, como por exemplo, o ODS 1: Erradicar a pobreza; ODS 2: Erradicação da Fome; ODS 4: Educação de Qualidade; ODS 8: Trabalho Digno e crescimento económico; ODS 10: Reduzir as desigualdades; e o ODS 17: Parcerias para a implementação dos objetivos.
Outro desafio, é a questão da notoriedade da Ajuda em Ação em Portugal. Apesar de sermos uma organização social internacional com mais de 40 anos de história, precisamos de conquistar o nosso espaço no setor da economia social portuguesa, constituído por mais de 70.000 organizações sociais. Contudo, apesar de ainda ser necessário o reconhecimento enquanto marca social junto de vários stakeholders, temos desenvolvido programas inovadores junto das populações vulneráveis que trabalhamos e nestes últimos anos, temos conseguido demonstrar o impacto do nosso trabalho. Apoio este, que só é possível com o financiamento de empresas e parceiros diversos. Mas ainda existe um longo caminho a percorrer, que só o podemos fazer em conjunto, como por exemplo, com os órgãos de comunicação social que apoiam na divulgação da nossa missão.
Que mensagem gostaria de deixar para as próximas gerações? O que falta mudar?
Acreditamos que a ação presente pode determinar o futuro. Assim sendo, a mensagem que gostaríamos de deixar às próximas gerações é que se envolvam nas suas comunidades, tendo um papel participativo. Fazer voluntariado, apoiar uma causa ou ser um ativista digital: Existem inúmeras opções que nos permitem fazer a diferença por um mundo melhor e criar novas e melhores oportunidades ao alcance de qualquer um. É acreditar no poder da mudança a partir da base… Sempre!