“Os jovens também devem ter em consideração aquilo que os motiva, e não unicamente as necessidades e tendências do mercado.” afirma Conceição Matos, Diretora do Departamento de Formação Profissional do Instituto do Emprego e Formação Profissional – IEFP.
O mercado de trabalho atual está em constante mudança devido à rápida evolução da tecnologia e, consequentemente, do meio digital. Um aluno que está a finalizar o ensino secundário, o que deve ponderar de modo a fazer uma escolha que contribua para o seu sucesso académico e profissional e que vá ao encontro das necessidades futuras do mercado?
Efetivamente, a transição digital tem vindo a mudar a forma como vivemos e como trabalhamos e como nos relacionamos, sendo fundamental que nos adaptemos a essas mudanças. E, se há algo que se tornou um dado adquirido com a pandemia de COVID-19 é que o digital assumiu uma dimensão sem precedentes, afirmando-se em áreas como o teletrabalho, o ensino à distância, o comércio eletrónico, as consultas online, o entretenimento e os contactos sociais.
Não obstante, para além do digital, são hoje reconhecidos três tipos de transição com profundos impactos no mercado de trabalho e no que poderá vir a ser o desenho das profissões do “futuro”: a transição climática; a transição demográfica; e a transição digital, onde se incluem as transformações associadas à designada indústria 4.0, em consequência da crescente introdução nos processos produtivos da robotização, da automação, da impressão 3D, da internet das coisas e da inteligência artificial, entre outros. Assim, para um aluno que esteja a finalizar o ensino secundário, e tendo em consideração os dados que hoje são conhecidos, bem como as tendências de evolução do mercado, as suas escolhas profissionais poderão passar por ter em consideração as áreas STEM – Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática e/ou TICE – Tecnologias de Informação, Comunicação e Eletrónica; as profissões ligadas à designada economia verde (sustentabilidade do meio ambiente) a economia azul que assim é denominada quando nos referimos às profissões relacionadas com a sustentabilidade dos oceanos, bem como tudo o que se possa associar com o envelhecimento ativo e o apoio às pessoas idosas, onde se incluem as áreas da saúde e dos serviços pessoais e à comunidade.
Os jovens devem procurar fazer escolhas informadas e, para esse efeito, procurar responder a três questões fundamentais:
1. Quais são as minhas áreas de interesse e motivações?
2. De entre as minhas áreas de interesse, será que tenho o perfil adequado?
3. E, por último, a questão não menos importante é a de procurar saber “para que me serve esta profissão e onde a posso exercer? Implica explorar informação sobre o mercado de trabalho, sobre os setores possíveis onde essa profissão pode ser exercida, etc. Na verdade, o que procura fazer é listar as áreas de interesse, projetar-se enquanto pessoa no desempenho dessa profissão e procurar saber qual é o potencial de inserção no mercado de trabalho.
Para apoiar esta importante decisão (que deve ser tomada não no momento da conclusão do ensino secundário, mas antes de ingressar neste ciclo de estudos), as escolas dispõem de serviços de orientação. Também no IEFP ou nos Centros Qualifica, caso a opção passe pelo ingresso num curso de formação profissional, pode ser prestado este apoio ao processo de encaminhamento e de tomada de decisão.
Com a generalização da utilização das novas tecnologias, é imperativo que os formandos tenham maior especialização e competências a este nível. De que forma(s) os formandos poderão obter essa especialização?
No que ao IEFP diz respeito, estamos, precisamente, a desenvolver várias medidas e projetos de formação na área digital que visam a aquisição ou o reforço de competências da população portuguesa a este nível. Concretamente no que diz respeito aos jovens, temos vindo a promover várias medidas, sendo que, tendo em conta o público em apreço, gostaria de destacar o Programa Jovem + Digital e o UPskill.
O Programa Jovem + Digital insere-se no âmbito da política pública de formação profissional que visa o desenvolvimento de competências digitais em tecnologias e aplicações digitais, com vista a uma maior qualificação do emprego e à resposta a necessidades atuais e perspetivas do mercado de trabalho.
Pretende promover a obtenção de competências específicas na área digital e contribuir para o reforço de competências profissionais de jovens adultos, com vista a melhorar o seu grau de empregabilidade. Os seus destinatários são jovens adultos, com idade entre os 18 e os 35 anos, inscritos no IEFP como desempregados, sendo que, quanto às habilitações, podem encontrar-se numa das seguintes situações:
- possuir o 12.º ano de escolaridade completo ou habilitação de nível superior;
- ter frequentado o ano terminal do ciclo formativo de nível secundário, sem o ter concluído;
- encontrar-se em processo de reconhecimento, validação e certificação de competências de nível secundário.
Os percursos de formação na área digital constam do Catálogo Nacional de Qualificações, e têm uma duração máxima de 350 horas.
O Programa UPskill é um programa de formação na área digital, que visa a reconversão, até 2023, de cerca de 3.000 ativos em profissionais da área de Tecnologias de Informação, Comunicação e Eletrónica.
Este projeto assenta numa parceria que envolve este Instituto, o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Públicos, o ISCTE-IUL e a Associação Portuguesa para o Desenvolvimento de Comunicação.
O UPskill consubstancia-se na realização de cursos de formação intensiva e especializada, que procuram responder a necessidades transversais efetivas, diagnosticadas junto das empresas do setor. Ou seja, de certo modo, são cursos “à medida”, que visam responder às reais necessidades das empresas. Os cursos têm uma duração de 6 a 9 meses e compreendem formação teórica e prática em contexto de trabalho. A formação teórica decorre em Instituições de Ensino Superior, seguida da formação prática em contexto de trabalho (que dura, em regra, 3 meses), e a respetiva integração profissional numa empresa aderente.
Destina-se a ativos com formação de nível secundário e/ou licenciatura, que se encontrem, preferencialmente, em situação de desemprego ou de subemprego. Considera-se situação de subemprego, aquela em que a pessoa detenha um contrato para o desempenho de funções ou serviços para os quais as habilitações requeridas sejam inferiores às detidas pelo contratado.
Também ao nível dos planos de formação da rede de centros do IEFP, está definido que 25% da nossa oferta formativa, deve abranger a área digital, existindo, para além dos programas específicos acima referidos, uma larga oferta na área do Digital, nomeadamente no que se refere aos Cursos de Aprendizagem e aos Cursos de Especialização Tecnológica (CET), vocacionados para a formação de qualificações intermédias (nível 5 do Quadro Nacional de Qualificações).
Neste âmbito, não queria deixar de referir que, a par dos Cursos de Aprendizagem já existentes, foi criada uma nova tipologia, os Cursos de Aprendizagem+, que alargou a faixa etária de abrangência para os 29 anos, cujo ingresso pode ser feito por titulares do ensino secundário ou equivalente. Estes cursos, permitem o prosseguimento de estudos e o acesso ao Ensino Superior e oferecem ainda, a possibilidade de reconversão profissional a jovens adultos já detentores de outra qualificação.
Esta oferta formativa é promovida quer pelos Centros de Gestão Direta quer pelos Centros de Gestão Participada que integram a rede de centros do IEFP (consultar www.iefp.pt).
Durante a sua formação, o que é que um jovem deve fazer para melhor estar preparado para a realidade do mercado?
Deve, em primeiro lugar, ter bem presente duas ideias centrais: querer ser um profissional de excelência e ter a consciência de que, para continuar a ser um profissional de excelência, precisa de se manter atualizado. Para isso precisa de participar, de forma regular, em processos de aprendizagem ao longo da vida.
Exatamente porque as mutações no mercado de trabalho são contínuas e cada vez mais rápidas, todos nós temos de ter consciência da importância da aprendizagem ao longo da vida e da necessidade de procurar assegurar a atualização dos nossos conhecimentos e competências. Queria, contudo, dar nota de que, como referi, os jovens também devem ter em consideração aquilo que os motiva, e não unicamente as necessidades e tendências do mercado. Deve assim procurar-se um equilíbrio entre a vocação e a empregabilidade. Ter apenas em consideração o que se gosta ou as áreas para as quais considera ter maior aptidão sem qualquer preocupação com a empregabilidade pode criar dificuldades acrescidas em se conseguir emprego.
Por sua vez, atender-se exclusivamente às necessidades do mercado de trabalho sem considerar as motivações e interesses pessoais pode gerar sentimentos de insatisfação e de frustração que dificultam o seu seu ajustamento profissional. O difícil é conseguir encontrar este equilíbrio entre o perfil pessoal e as necessidades do mercado de trabalho. Aliás, estas questões colocam-se ao longo das múltiplas experiências profissionais que as pessoas vão experienciando ao longo da sua vida ativa.
Atualmente, para além de serem valorizadas as formações académicas, sabemos que as soft skills são também fortemente valorizadas pelas entidades empregadoras. Como podem os jovens investir no desenvolvimento das suas soft skills?
Antes de mais, importa começar por clarificar o conceito de soft skill: estas são competências que têm a ver com o comportamento socioprofissional. Envolvem aptidões cognitivas, comportamentais e sociais. Podemos dizer que são habilidades particulares, que se desenvolvem através das experiências pessoais, por exemplo, dos livros que lemos, da informação que pesquisamos, das viagens que fazemos, das interações pessoais que vamos fazendo, das atividades lúdicas em que nos envolvemos, da cultura e da educação de cada pessoa, entre outros fatores. Estamos a falar de competências que são transversais à generalidade das profissões, como por exemplo, a capacidade de desenvolver uma relação positiva com o trabalho e com os colegas, influenciando positivamente o ambiente. A inteligência emocional, o pensamento crítico, a empatia, a colaboração, a criatividade, a resolução de problemas, a fluência verbal, o domínio de línguas, entre outras. Normalmente, as entidades empregadoras procuram recrutar pessoas que sejam técnicos especialistas numa determinada área, mas que tenham também um bom reportório de soft skills que são, precisamente, os aspetos diferenciadores na medida em que refletem o perfil pessoal e as características que a podem tornar mais ou menos atrativa, isto é, mais ou menos “empregável” aos olhos do recrutador.
Só para ilustrar esta ideia, tive oportunidade de ouvir em tempos um empresário referir num seminário que, quando contrata um profissional, “contrata a atitude”. Dizia ele que pode ter um grupo de engenheiros de uma mesma área profissional, sendo que, o que os destinge é exatamente a “atitude”.
Muitas destas competências são adquiridas em contextos familiares, sociais, académicos e profissionais e, obviamente, no contexto da formação profissional. Na oferta formativa do IEFP, a generalidade dos cursos contemplam módulos específicos, que visam promover a aquisição destas competências, às quais acresce o facto de que, em contexto de formação, o próprio contacto entre os formandos, entre formandos e formadores, o desenvolvimento de projetos em equipa, etc., são fatores potenciadores da aquisição de soft skills. Também a Formação Prática em Contexto de Trabalho associada às formações por nós desenvolvidas, permitem aos formandos não só contactar com as tecnologias e técnicas utilizadas nas empresas e aplicar os conhecimentos e competências adquiridos em contexto de formação a atividades concretas em contexto real de trabalho, mas também desenvolver hábitos de trabalho, espírito empreendedor e de colaboração, entre outras competências, não necessariamente “técnicas”.
E voltando à questão anterior, a consciência da importância da aprendizagem ao longo da vida, também pode e deve conduzir a um investimento consciente na aquisição e desenvolvimento deste tipo de competências.
Como é que o IEFP pode contribuir para preparar e apoiar os formandos para as exigências e a volatilidade do mercado de trabalho?
O IEFP, enquanto serviço público de emprego e de formação, que tem por missão implementar políticas ativas de emprego e contribuir para o emprego qualificado, há muitas décadas que assume a liderança na organização e oferta de formação profissional no nosso país. É um trabalho essencial, assente na qualidade, no conhecimento e na experiência desenvolvida ao longo de muitos anos e isso reflete-se nos trajetos profissionais das pessoas, após terminarem a sua formação. Promovemos formação de qualidade, que é a melhor maneira de preparar um profissional e ajudá-lo a ingressar na vida ativa, independentemente da área. Simultaneamente, procuramos ir ao encontro das necessidades das empresas, sendo que, neste quadro, importa destacar o papel fundamental que estas assumem, bem como os parceiros sociais, na identificação das necessidades de qualificações e na indicação das áreas e saídas profissionais prioritárias para a oferta formativa.
O Programa UPskill, de que já falei, é um exemplo desta sinergia, ao promover cursos de formação intensiva e especializada, que procuram responder a necessidades transversais efetivas, diagnosticadas junto das empresas do setor. O processo inicia-se com a indicação de interesse por parte de empresas em criar vagas numa dada tecnologia, ou seja, de certo modo, são cursos “à medida”, que visam responder às reais necessidades das empresas e que, no final, garantem, a empregabilidade de cerca de 80% dos formandos.