Entrevista | Arlindo Oliveira: A relação Homem vs. Máquina
Fascinado por informática e tabuleiros de xadrez, Arlindo Oliveira, Professor do Instituto Superior Técnico e Presidente do Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores (INESC), defende, em entrevista, que a investigação tecnológica não está a evoluir abruptamente para o controlo humano.
Com um impacto mais profundo do que o fogo ou a eletricidade, a Inteligência Artificial (IA) tem gerado acesos (e inquietantes!) debates: Estaremos próximos da anulação do efeito “Botão Vermelho”?
“Somos a espécie animal mais inteligente que se conhece, produto de uma extraordinária evolução biológica com milhares de milhões de anos. Daí que não seja de estranhar que hoje queiramos ultrapassar os nossos próprios limites, criando sistemas que reproduzam comportamentos inteligentes de forma artificial” (Inteligência Artificial, Arlindo Oliveira, 2019). Existem razões para recearmos que a Tecnologia consiga possuir Humanidade?
A ambição é criar sistemas com intelecto e aptidão, que terão aplicações, a serem empregues em diversas áreas, incluindo o Espaço ou as profundezas dos Oceanos.
Podemos coexistir. Podemos nunca os reproduzir. Podemos decidir que a Inteligência Humana terá um suporte diferente.
É só mais um passo em frente e uma visão a longo prazo.
A verdade é que a IA está connosco há largos anos. Dos algoritmos de recomendação aos modelos de linguagem, considera que estamos a manusear o conhecimento tecnológico sem existir uma reflexão ética?
Nos últimos anos, verificou-se uma perceção de uma evolução mais repentina, e, por conseguinte, a sociedade teme que o crescimento acentuado supere o processo de reflexão filosófica… Mas não se trata de uma questão recente.
Pessoalmente, não entendo que a Tecnologia esteja a evoluir rápido demais para o nosso controlo. No entanto, as opiniões divergem.
“Descobrir materiais e soluções ou tornar a sociedade mais rica e produtiva”. Que potencialidades é que se ampliam na ligação estreita entre o Homem e a Máquina?
Ao utilizarmos a internet, acedemos a uma memória muito mais vasta do que a de qualquer indivíduo. A ampliação da mente humana remonta à invenção da Imprensa por Gutenberg, porém a única diferença manifestada, atualmente, é a viabilidade de assistirmos a agregações, com mente e pensamento.
“Os computadores têm aprendido bastante. Às vezes tão bem que até pensamos que são realmente inteligentes”, afirmou no podcast “Deixar o Mundo Melhor”, do jornal Expresso. A desinformação e a possibilidade de a realidade se confundir com a mentira são ameaças confirmadas?
A desinformação, em particular com as deepfakes e com os conteúdos personalizados, a violação da privacidade, e a disrupção da economia e do emprego, são, efetivamente, riscos inerentes e significativos.
A IA desencadeará “alterações profundas”. A substituição de atributos exclusivamente humanos representa um dos grandes desafios?
A capacidade do Homem de perceber e gerar linguagem liga-se intimamente a um conjunto de planos, objetivos e motivações, que estão, completamente, ausentes dos modelos inteligentes, não tendo consciência, emoções ou livre-arbítrio.
Contudo, o facto de as máquinas terem sensibilidade e empatia parece-me positivo, uma vez que serão capazes de identificar as nossas necessidades.
Entre o abismo e o progresso, o ponto de equilíbrio encontra-se na regulamentação, sem esmagar a revolução?
Apesar de não ser, particularmente, fácil de atingir, é crucial estabelecer um equilíbrio entre regulamentação, que proteja os Diretos Humanos, e que, simultaneamente, não impeça o desenvolvimento da Tecnologia, face ao potencial de vantagens para o mundo, através da seriação de candidatos a uma vaga laboral ou ao Ensino Superior, da condução autónoma, do armamento ou das ações de Marketing.
“O facto de as máquinas terem sensibilidade e empatia parece-me positivo, uma vez que serão capazes de identificar as nossas necessidades.”
O mercado de trabalho sofrerá, inevitavelmente, mudanças significativas, nomeadamente com o aparecimento de novas profissões. Que competências serão exigidas no seio empresarial do futuro?
Sendo que as funções mais repetitivas serão, facilmente, perdidas para a automatização, como a elaboração de textos — respostas a clientes, sumarização, relatórios de eventos, elaboração de atas de reuniões, e due dilligence —, profissões criativas, que exijam a atuação em ambientes distintos, o pensamento recorrente, a criação de produtos ou ideias de negócio, manter-se-ão.
O maior perigo posiciona-se, a meu ver, na procura incessante por habilidades específicas, sem que exista uma adaptação suficientemente ágil para formar em número necessário.
Que tendências se perspetivam?
Penso que será a integração de modelos de linguagem, que passarão de chatbots a interfaces inteligentes, com sistemas de informação internos das empresas, aptas a realizar análises contabilísticas e económicas.
Afinal, que controlo é que detemos sobre a IA?
Neste momento, o controlo é total.
Se existirá uma situação, em que, eventualmente, perdemos a autoridade, é difícil de prever, mas, caso aconteça, a legislação encarregar-se-á, impondo normas específicas.
“(…) profissões criativas, que exijam a atuação em ambientes distintos, o pensamento recorrente, a criação de produtos ou ideias de negócio, manter-se-ão.”