Guardião do Oceano: Uma iniciativa de mudança
Gil Rosa é o fundador do projeto “Guardião do Oceano”, que tem como missão sensibilizar a população e mobilizar a comunidade para serem agentes ativos de mudança na proteção e no bem-estar do ambiente e dos ecossistemas. Este projeto é uma iniciativa da Associação Guardião da Natureza, que atua através das ações de limpeza, realizadas na Área Metropolitana de Lisboa e na Zona Oeste.
Como surgiu a ideia de criar esta organização de conservação do ambiente conhecida como “Guardião do Oceano”? Qual foi a principal motivação?
Antes de mais, importa esclarecer que o projeto Guardião do Oceano é uma iniciativa da Associação Guardião da Natureza, criada formalmente em 2021. No início de 2019, comecei a prestar mais atenção às praias da Zona Oeste com regularidade e fui-me apercebendo da quantidade de lixo que nelas aparecia todos os dias. No espaço de um mês recolhi mais de uma tonelada de resíduos, e esse foi o mote para criar uma iniciativa: “Se eu consegui apanhar uma tonelada de lixo sozinho, quantas conseguirei recolher juntamente com um grupo de pessoas unidas pela mesma motivação?”. Depois de falar com algumas pessoas próximas, a ideia de criar um movimento começou.
Durante o percurso da organização, já contaram com algum tipo de apoios?
A equipa responsável pelo projeto inclui sete Guardiões voluntários que organizam, coordenam e dinamizam todos os procedimentos necessários para as ações. Este planeamento decorre durante os tempos livres, devido aos nossos voluntários serem estudantes e trabalhadores com diversas áreas de ocupação. O projeto tem sido apoiado por diversas entidades com donativos materiais, alimentícios e monetários para a obtenção de material de proteção individual e ferramentas para os voluntários.
Em relação ao tipo de lixo que é encontrado nas praias, o que se encontra de forma mais abundante? Por outro lado, de uma forma geral, qual a quantidade de lixo recolhido semanal e/ou mensalmente?
Até então realizámos mais de 300 ações e recolhemos mais de 110 toneladas de resíduos das praias, zonas costeiras e florestas. A quantidade de resíduos recolhida depende do local de atuação. Por norma, nas praias, encontramos resíduos mais pequenos, como por exemplo, os microplásticos, beatas e cotonetes. Enquanto nas zonas costeiras e nas florestas, muitas vezes em virtude dos despejos, há volumosas quantidades de resíduos recolhidos, que chegam a ser centenas a milhares de quilogramas. Neste caso estamos a falar de arcas frigoríficas, pneus, televisores…
A poluição e as alterações climáticas são temas cada vez mais abordados pelas grandes organizações mundiais. Nesse sentido, enquanto organização que participa no combate à poluição, consideram que têm conseguido sensibilizar a população para a limpeza de praias?
O projeto assenta em 3 pilares: atuar, mobilizar e criar. Atuamos, recolhendo os resíduos que invadem as praias, as florestas, os rios, as ruas e todos os locais que precisarem da nossa intervenção.
Desde o início, que um dos nossos intuitos é sermos reconhecidos pela nossa proatividade e pela atuação que temos. Por isso, criámos o mote “Guardião em Ação”.
A nossa preocupação, é, efetivamente, meter as mãos na massa. Se identificarmos um local sujo, organizamo-nos em grupo para intervir. O convite é depois alargado à comunidade em geral, mas a intervenção não deixa de ser realizada se não tivermos participantes. Posteriormente, divulgamos os resultados das ações, mostrando o quão grave é este problema.
Sentimos que contribuímos na criação de oportunidades comunitárias interventivas e que as pessoas são sensíveis à causa.
“Gostávamos que fosse evidente para todos que, com um único projeto podemos mobilizar-nos em diversas frentes e com contributos importantes em todas elas. Se isto contribuir para inspirar gerações presentes e futuras, é a cereja no topo do bolo.”
Os jovens são o futuro do planeta, e é necessário consciencializá-los para que o mundo consiga combater estes fatores de perigo. Consideram-se um exemplo a seguir pelas gerações futuras?
Mais do que sensibilizar e inspirar, importa fazer. Procuramos reunir esforços para que, em conjunto, as ações possam ser mais simples. Aproveitamos também a dinamização das ações enquanto espaço que nos permite criar momentos de convívio e de atividade física, importantes para a saúde mental.
Gostávamos que fosse evidente para todos que, com um único projeto podemos mobilizar-nos em diversas frentes e com contributos importantes em todas elas. Se isto contribuir para inspirar gerações presentes e futuras, é a cereja no topo do bolo.
Visto que as mudanças no comportamento da população têm grande impacto no combate e prevenção deste problema, quais os conselhos que dariam a quem não tem práticas ecológicas?
A mudança comportamental é um fenómeno complexo que depende de hábitos individuais, mas também, do meio envolvente. Tornar os ambientes mais propícios a que os indivíduos intuitivamente atuem é, entre todas, uma das melhores estratégias.
Quais foram as coisas mais inacreditáveis que encontraram numa ação? Qual é o procedimento quando as encontram?
Temos sido recorrentemente surpreendidos com algumas situações. Não são raras as vezes em que iniciamos uma ação, tendo em mente que recolheremos uma determinada quantidade de resíduos, mas terminamo-la com o triplo ou quádruplo do previsto. Nestas alturas, os apoios das Juntas de Freguesias locais e da autarquia são fundamentais, uma vez que são elas que nos dão apoio logístico no transporte dos resíduos para os destinos corretos.
Há, por vezes, algumas situações desagradáveis como quando encontramos cadáveres de animais em decomposição. Dependendo do local, informamos as autoridades responsáveis para avaliação e resolução da situação.
O aumento da poluição no nosso país e no mundo é algo preocupante. Acreditas que ainda há esperança de poder minimizar alguns dos danos já feitos ao nosso planeta?
Há aspetos que, neste momento, são irreversíveis, como por exemplo, a extinção de certas espécies. Cabe-nos a nós, humanidade, decidir se queremos continuar a esse ritmo de impactos desastrosos no ambiente, ou atuar, contribuindo para atenuar e modificar comportamentos.
Não interessa refletir apenas sobre as consequências a longo prazo, mas também naquelas que advêm imediatamente do estado atual do planeta. A poluição e as alterações climáticas têm consequências nefastas na biodiversidade e nos ecossistemas, que naturalmente nos afetam e colocam em causa a nossa qualidade de vida. Quantas e quais serão as consequências para a saúde humana? E para a saúde animal e ambiental?
Quais são os planos a longo prazo? Têm a ideia de expandir a vossa organização para mais zonas? O que idealizam para o futuro?
Neste momento, a nossa equipa é constituída por elementos em que a principal ocupação não é o projeto, o que condiciona, muitas vezes, a nossa disponibilidade para realizar mais atividades.
Para já, a curto-médio prazo, prevemos manter a nossa atuação na mesma área, tendencialmente aos fins-de-semana, que é quando temos mais tempo. Uma vez que se torna difícil projetar a longo prazo, tentamos manter os pés assentes na terra e fazer planos, mediante a nossa disponibilidade atual.
Claro que a ambição de poder chegar a mais locais e pessoas existe sempre, mas também temos uma certa dose de realismo a propósito do trabalho que existe para fazer (que é imenso). Neste momento, o que nos faz sentido é atuar com os recursos que temos, nos locais que, para nós, são mais acessíveis, contando com as relações comunitárias e institucionais já desenvolvidas.