O Ensino Superior é a porta de entrada, e cabe-te a ti encontrar os melhores caminhos para te destacares na procura de um emprego. António Cunha é Presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas e fala-te sobre a preparação para esta nova fase da tua vida e como a deves encarar.
Entrar no Ensino Superior é hoje cumprir uma expetativa que a família, a sociedade e o próprio país têm de mim. Por outro lado, já não é o curso superior que me vai garantir emprego. Como devo olhar para a aventura no Ensino Superior e o que devo procurar retirar dela?
No contexto atual, qualquer opção é legítima, o que é preciso é que ela seja informada e consciente. Se estivermos a falar de um jovem que pretende trabalhar durante dois anos para ganhar experiência profissional, e só depois ingressar no Ensino Superior, essa é uma escolha completamente legítima e que só precisa de resultar de uma decisão consciente e em linha com um objetivo final.
Aquilo que não deve acontecer – e que acontece muitas vezes – é a escolha de determinada universidade ou curso por estarem mais perto, ou porque alguém os sugeriu. Isso é que não faz sentido, porque todos nós somos diferentes e queremos coisas diferentes, e precisamos de gerir a nossa formação e o nosso desenvolvimento pessoal e académico de forma consciente. Esta é uma obrigação do estudante, mas também da sua família e daqueles com quem partilha as suas decisões de vida.
A meu ver, é essencial entender que há um futuro para construir, um futuro que depende certamente de muitos fatores, mas que depende sobretudo das opções que fazemos, daquilo que queremos e daquilo que procuramos. Isso pressupõe estar informado, conhecer, saber, ter opiniões concretas. No fundo, ter capacidade crítica e pensamento sobre as coisas.
E será que os jovens têm, atualmente, a noção exata do que é uma licenciatura e daquilo que essa formação lhes pode conferir? Ou ainda existe a ideia romântica de que o Ensino Superior é garantia de entrada no mercado de trabalho?
A meu ver, deveria ser um desígnio da sociedade e das pessoas mais maduras, sermos capazes de transmitir aos jovens que o futuro e que o seu papel nesse futuro passa, inequivocamente, pelo conhecimento. Esta é a ideia chave que os jovens deveriam ter presente, e sobre a qual não deveriam ter dúvidas. O modo através do qual os jovens podem adquirir esse conhecimento é seguir uma formação superior, escolhendo um dos cursos que estão disponíveis, mas também é possível que encontrem outras vias de obter esse mesmo conhecimento. É preciso é não andar perdido, porque isso não trará bons resultados no futuro.
Sou um jovem que está a terminar o 12º ano, e que sente que lhe falta a capacidade de fazer uma escolha fundamentada para o seu percurso de Ensino Superior. É possível corrigir isso nos próximos meses? O que devo eu fazer nesse sentido?
Os jovens podem sempre tentar corrigir. Pessoalmente, acho natural que um jovem possa não saber muito bem o que fazer, e aí pode deixar-se levar pela sua preferência por determinada área do saber, ou orientar a sua opção pelos índices de empregabilidade, por exemplo. É muito importante que, neste processo, procurem aconselhamento junto dos familiares e de todos aqueles que lhes são próximos, e também a profissionais das áreas de interesse, com uma visão mais concreta daquilo que está na cabeça dos jovens.
Para que os jovens tenham esta atitude proativa na definição do seu futuro, é preciso que tenham já alguma maturidade. Nem todos terão essa capacidade, e é a esse nível que a sociedade deve procurar colaborar.
Numa altura em que se popularizou a noção de empreendedorismo, é cada vez mais importante ser empreendedor do meu próprio currículo, antes de mais. O que podem os estudantes fazer durante a sua formação superior, que os destaque dos demais perante as empresas e o mercado de trabalho?
O empreendedorismo é uma questão de atitude. E a primeira ação empreendedora de alguém deve ser conduzida na procura da construção da sua formação e do seu perfil de competências, posicionando-se da melhor forma perante a sua profissão futura.
A palavra chave na abordagem ao mercado de trabalho é diferenciação. Hoje em dia, dominar o inglês é um exemplo de algo que deixou de ser uma vantagem e que passou a ser uma exigência, e uma valência que boa parte dos proponentes a um emprego possuem. Mas para além do inglês, o que falas? Alemão? Mandarim? Aí poderá residir a diferenciação.
Outra forma de obter essa diferenciação pode passar por experiências de trabalho – seja em contexto de estágio ou não – e/ou por outras formações (um curso tecnológico, por exemplo).
Tudo isto pode ser feito de uma forma mais calculista – com vista à obtenção de um determinado perfil de candidato – ou pode ser feito obedecendo à dimensão vocacional de cada um. O que é importante é investir em formações complementares, porque elas farão certamente a diferença.
O novo Governo reintroduziu um Ministério (da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior) que reflete uma maior preocupação com o Ensino Superior. De que forma é que isto pode impactar na vida universitária dos jovens que vão agora começar esse percurso?
A existência de um Ministério da Ciência, da Tecnologia e do Ensino Superior sempre foi algo reivindicado pelo Conselho de Reitores, porque achamos que a especificidade do Ensino Superior e da Ciência o justificam. Parece-me uma visão moderna e atual, e aliás a única que hoje se pode ter do Ensino Superior e, sobretudo, do ensino universitário, que é assente na investigação. Achamos que é uma evolução positiva, e temos a expetativa que se revele profícua, mesmo com as dificuldades de orçamento que continuamos a ter, fruto da situação que Portugal vai vivendo. Ter um ministério próprio permite ao Ensino Superior assumir uma centralidade política mais forte.
Quanto ao ensino universitário português, temos o objetivo de o tornar, cada vez mais, uma referência a nível internacional. Para isso, ele tem de ser alicerçado na investigação e essa articulação é o grande desafio que hoje enfrentam as melhores universidades do mundo. Desse ponto de vista também, a existência de um ministério dedicado ao Ensino Superior e à investigação parece-me muito positivo, na medida em que torna estes processos muito mais efetivos. Isso fará com que, a médio prazo, Portugal e os alunos portugueses desfrutem de melhores universidades.
[Entrevista: Tiago Belim]
[Foto: cedida pelo entrevistado]
[Esta entrevista é parte integrante do Guia de Acesso ao Ensino Superior 2016/17 da Mais Educativa, disponível para consulta aqui.]