António Cunha é o Reitor da Universidade do Minho e o responsável máximo pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, e aborda nesta entrevista no Guia de Acesso ao Ensino Superior da revista Mais Educativa o estado atual do sistema de ensino, as tuas prioridades e competências à entrada do Ensino Superior, e deita um olho ao que pode ser o teu futuro.
Quais devem ser atualmente as prioridades de quem ingressa no Ensino Superior? A sua vocação, a opinião dos pais, a empregabilidade do curso, o prestígio da instituição? Como hierarquizar tudo isto aos 17, 18 anos?
Esta é certamente uma das decisões mais importantes a tomar durante a nossa vida. Existem várias perspetivas possíveis, dependentes de cada um e das suas condições financeiras, sociais e culturais, pelo que não haverá uma receita única. Acredito sim que esta decisão deve ser tomada com o máximo de informação possível, de forma fundamentada, com dados sobre a instituição, sobre o curso e sobre as perspetivas. Acho perfeitamente aceitável que alguém se inscreva num curso com perspetivas de emprego baixas, o que não aprovo é que alguém o faça julgando que essas mesmas perspetivas seriam elevadas. A decisão pode, a meu ver, ter como prioridade a sua vocação ou qualquer outro aspeto, tem é que ser consciente e informada.
Em suma, diria que os jovens devem, acima de tudo, aconselhar-se com as pessoas da sua confiança, pesar toda a informação que têm, e no final decidir por eles próprios.
Há uma percentagem cada vez maior de licenciados em Portugal, e o Ensino Superior é cada vez menos um fator diferenciador para o emprego qualificado. O que pode dizer aos jovens desanimados com as suas perspetivas de futuro?
No princípio do século XX, o principal fator diferenciador entre as gentes era saber ler e escrever. Por volta dos anos 70, essa diferenciação passou a estar na frequência do Ensino Superior (acessível a cerca de 7% da população), e hoje a ideia passa por, a nível europeu, termos metade das pessoas com qualificações superiores, o que me parece ser algo francamente positivo.
Apesar disso, essa “diferenciação” tem hoje uma importância crescente, e continua ao alcance dos jovens, sobretudo através de formações complementares ou de experiências profissionais, e até da fluência numa terceira ou quarta línguas. Uma abordagem multidisciplinar também é bem-vinda, isto é, ter competências transversais a várias áreas. Tudo isto está cada vez mais ao alcance dos jovens – quase todas as universidades oferecem muitas opções extracurriculares formais e informais – e, em momentos de procura de emprego e de potencial seleção para o cargo, são mais-valias que podem conferir essa diferenciação.
Muito se tem falado dos cortes no financiamento ao Ensino Superior. Enquanto Presidente do CRUP, o que pode dizer aos jovens sobre este tema?
A oferta de Ensino Superior em Portugal tem grande diversidade e qualidade, tendo em conta o contexto internacional, ao ponto de, por esse mundo fora, o licenciado português ser frequentemente recomendado e requisitado.
Relativamente ao que tem acontecido nos últimos anos, entendo que o nosso sistema educativo poderia ser ainda mais capaz, caso fosse melhor financiado e fossem melhor atendidas as suas especificidades. Dada a natureza destes sistemas, o que está a acontecer atualmente ainda não reflete as medidas que foram tomadas, e revelar-se-ão mais tarde, se não forem corrigidas a tempo. A falta de financiamento vai continuar a manifestar-se, quer no envelhecimento do corpo docente, quer nas condições das instalações das universidades, sendo que o apoio social continua a ser e será sempre uma preocupação, enquanto houver um aluno com capacidades sem poder prosseguir estudos.
De resto, esperemos que o pior da crise já tenha passado, e que estes novos tempos possam trazer uma maior possibilidade de investimento no Ensino Superior, que seja mais condizente com o valor que devemos aportar a esta área que é estratégica para o país.
Como podem os jovens preparar-se para uma decisão acertada a altura de escolher o seu curso, e que competências considera essenciais para uma transição bem sucedida para o Ensino Superior?
Genericamente, os alunos que entram no Ensino Superior têm hoje um nível de formação interessante, o melhor de sempre em Portugal, o que deve ser um motivo de satisfação para todo o sistema de ensino. Contudo, considero que, e em reflexo daquilo que é a sociedade atual, os níveis de maturidade e a capacidade de tomada de decisão têm vindo a decrescer, e só se consegue combater isto com conhecimento e com uma atitude crítica, o que me parecem ser áreas chave para os jovens desenvolverem, bem como a seletividade e a capacidade de síntese, fundamentais num mundo de informação em permanência, e da qual é essencial que os jovens saibam retirar o que precisam para construirem a sua visão do mundo.
No final, importa os jovens perceberem que aquilo que faz verdadeiramente a diferença é a capacidade de tomarem as suas próprias decisões e de encontrarem o seu caminho.
Entrevista: Tiago Belim
Foto: Universidade do Minho