David Justino é Presidente do Conselho Nacional de Educação, professor universitário e Presidente do Conselho Estratégico da edição de 2015 da Futurália. A Mais Educativa conversou com aquela que é uma das pessoas mais influentes na área da educação em Portugal, e damos-te a conhecer algumas ideias fundamentais para a tua relação com a escola e com a qualificação profissional.
Como é que chega ao Conselho Estratégico da Futurália, e quais são as suas expetativas e objetivos para a feira?
Através do convite do Comendador Rocha de Matos, Presidente da Associação Industrial Portuguesa, que me desafiou no seguimento do meu contributo para o desenvolvimento da educação em Portugal. É um reconhecimento que muito me honra, e penso que esta participação na edição de 2015 da Futurália encaixa na perfeição naquela que tem sido a minha atividade.
Em todas as boas iniciativas, o mais importante é que sejam consolidadas e que cresçam. A Futurália tem hoje uma expressão que não tinha, e a ideia é corresponder às expetativas de todos: pais, professores, escolas e dos jovens, mas também das empresas que estão envolvidas no projeto. Mais que isso, está no horizonte a perspetiva de dar a este evento uma dimensão internacional, que possa não só atrair pessoas de fora, como também exportar algum do know-how que tem sido desenvolvido em torno desta iniciativa.
Neste momento, quais são os grandes desafios na área da educação, e consequentemente na realização desta feira?
O grande desafio é não nos deixarmos iludir. Nestas feiras aparecem, muitas vezes, as novas tecnologias, e é necessário não esquecer que a mais importante tecnologia na educação é o professor. É da sua qualidade, da sua dedicação e do seu profissionalismo que depende o sucesso ou o insucesso dos alunos. A aplicação dos tablets, as escolas virtuais, etc., são instrumentos que o professor pode potenciar, mas que não dispensam o seu trabalho, nem que seja como mediador. Repito, por mais avanços tecnológicos que conheçamos, por mais que a Internet disponibilize conteúdos digitais, o papel do professor e o contacto pessoal e a relação que ele estabelece com os alunos é decisiva. Temos de estar atentos às novas tecnologias, mas o foco tem de permanecer aqui.
Num mundo onde a interatividade digital está presente em todos os momentos, não será esse papel do professor cada vez mais difícil de cumprir?
É preciso perceber que não é possível aprender a brincar. Aprender dá muito trabalho, e aprender bem dá mais trabalho ainda. Depois, há que desmistificar a ideia de que as tecnologias podem substituir a ação humana: quanto mais as primeiras evoluem, mais valor assume a segunda na sua utilização. Como é que isto tudo joga? É um facto que as coisas mudaram, ou seja, o nível de acesso ao conhecimento é completamente diferente do que era há 10 anos atrás, e essa acessibilidade permite criar condições para termos mais e melhor conhecimento, mas permite também não esquecer que há riscos que devem ser acautelados quer pelas famílias quer pelos professores. Pensarmos que o professor vai continuar a ensinar como há 20 ou 30 anos atrás é um erro, mas isso não quer dizer que lhe exija menos formação e conhecimento, pelo contrário. Precisamente para ter a capacidade de lidar com estes novos desafios. Se a ideia de aprender tudo através de uma máquina estivesse correta, um chip no nosso cérebro resolveria a questão!
Esta é uma feira claramente vocacionada para a qualificação profissional. Na sua opinião, o que é que é essencial os jovens apreenderem neste domínio?
É essencial compreendermos algo que, na minha opinião, as gerações mais jovens já entenderam melhor que nós mais velhos: a transição entre a escola e o mercado de trabalho já não significa um fechar para o outro se abrir. Há agora um fenómeno de transição mais ou menos duradouro, e que vai levar a que muitas vezes os jovens demorem algum tempo até estabilizarem profissionalmente. Até lá, da escola passar-se-á para o mercado de trabalho, para depois se voltar à escola enquanto se trabalha, e por aí fora. Dantes tínhamos a vida resolvida aos 25 anos, agora penso que não existem condições para que isto se possa repetir no futuro, pelo menos na generalidade dos casos, onde os jovens vão andar a experimentar vários domínios, ter várias experiências laborais, até poderem definir claramente uma carreira.
Na Futurália, os jovens poderão confrontar-se com a diversidade de soluções e de ofertas de que vão dispor e que vão ter de gerir, ou seja, em vez de imaginarem um trajeto linear, devem ter maior conhecimento das alternativas para descobrirem os caminhos que podem seguir. Sem o conhecimento dessas alternativas, podem ficar desadaptados à realidade.
Acha que o atual enquadramento social, económico e profissional do país pode desmotivar um número cada vez maior de jovens a apostar na sua formação?
Acho que a pior das conclusões a que se pode chegar é a de que isto vai dar tudo no mesmo. Em termos mediáticos, o mais importante é quando o homem morde o cão, e não o contrário, e aqui é a mesma coisa: podemos falar nas dificuldades de emprego dos jovens, mas é necessário dizer que uma parte significativa deles arranja efetivamente trabalho ao fim de algum tempo. Assim como se fala no crescimento da emigração, e não se diz que a maior fatia das pessoas que vão para fora continuam a não ter grandes qualificações. Claro que há mais jovens licenciados a emigrar, mas isso é porque há mais portugueses qualificados, é uma questão de probabilidades.
O que é importante destacar é que a vida de um jovem não é tão fácil como há 10 ou 20 anos atrás, disso não há dúvidas. A sociedade não tem conseguido gerar oportunidades para todos, e é precisa uma adaptação a essa realidade. E os jovens estão cada vez melhor preparados para isso.
[Foto: Frederico Oliveira]